“mas
presos são quase todos pretos
Ou quase pretos, ou quase brancos quase pretos de tão pobres
E pobres são como podres e todos sabem como se tratam os pretos”
Ou quase pretos, ou quase brancos quase pretos de tão pobres
E pobres são como podres e todos sabem como se tratam os pretos”
(HAITI
– Caetano Veloso)
“Seria
a pena de morte a solução milagrosa para os males sociais? Extirpar seres
humanos, ao argumento de que não se ajustam ao modelo social é ato válido,
necessário, salutar?”
(Vitor Guglinski)
A pena de morte
parece ser a cura para todas as mazelas produzidas pelo crime...
Parece, mas não é.
Nenhum crime
justifica outro. Se é errado para a pessoa comum o ato criminoso, e dentre
esses atos o assassinato é um dos mais condenáveis, por que para o Estado, esse
crime é justificável?
A máxima “bandido bom
é bandido morto” só é compreensível quando parte da boca de pessoas que não
crêem num Deus Justo e Soberano, capaz de transformar e redimir as pessoas...
E são, justamente, as pessoas que se dizem possuidoras de uma fé em um Deus Único
e Bom, em um Deus capaz de perdoar e transformar, são, justamente essas, em grande parte, as
pessoas que mais batem no peito e defendem a pena de morte, sejam de qual denominação religiosa a que pertençam: católicos, evangélicos, batistas, cristãos ou não...
Contradição das contradições!
Contradição das contradições!
Os ditos ateus e
comunistas são mais humanos e realistas, porque, em sua grande maioria,
defendem, sem saber, a revogação da pena de Talião por Cristo, que veio ao
mundo para nos ensinar a lei do perdão e do amor.
Hipócritas e fariseus
dirão: mas e se fosse seu filho? Se fosse seu filho a vítima de um crime
hediondo?
Então respondo com
outra pergunta: e se fosse o seu filho a pessoa que cometeu esse crime
hediondo? Se fosse seu filho que, por uma fatalidade ou mesmo de caso pensado,
num momento de desespero, o autor de um crime que condenasse à pena capital?
Do ponto de vista
ético/religioso, existem ainda questões mais sérias, mas não pretendo fazer uma
análise sob este enfoque...
Quero falar do ponto
de vista legal.
A justiça em nosso
país (e por recentes notícias, em todo o planeta) é muito falha. Ainda vivemos
sob o manto do falso legalismo. Mate primeiro, pergunte depois... Esse é o lema
que vemos em todo o orbe terrestre. Infelizmente.
No nosso país, temos
exemplos clássicos de erros judiciais que prejudicaram a vida e levaram à morte
centenas de pessoas, inclusive por linchamento, ato tão ou mais criminoso que o
próprio crime imputado à vítima do “engano”...
“Ah!, nós linchamos
essa pessoa sim, ela morreu, desculpe, mas pensamos que fosse ela a culpada...”
Isso cola? Isso vai
trazer de volta a pessoa assassinada (e é esse o termo correto: assassínio
sim!) pela coletividade enraivecida pelos programas televisivos que insuflam
idéias nas cabeças vazias de quem se deixa levar por ondas de histeria?...
Aliás,
a irresponsabilidade da mídia, ávida por audiência, é um capítulo à parte... Há algum tempo o Brasil acorda,
almoça, janta e vai dormir ouvindo diversos apresentadores de telejornais que
homicidas, estupradores, sequestradores, traficantes etc. merecem pena de
morte... E não é exagero nenhum afirmar que a população se deixa influenciar
por esse tipo de “jornalismo”.
“Se
com o devido processo legal, inocentes amargam anos de cadeia devido a erros,
imagine sem ele?” (Leonardo Sakamoto)
Apesar da garantia à liberdade do cidadão ser
direito consagrado pela Constituição Federal, a ocorrência de prisão ilegal é comum e origina-se de
arbitrariedade ou incompetência de uns e má fé, equívocos burocráticos ou
apurações irregulares de outros.
Segundo o advogado
penalista Maicon Prata, esses erros são mais comuns do que se pensa. O fato de
grande parte das provas de crimes ser levantada com declarações de vítimas ou
testemunhas, aumenta as chances de erro: “As pessoas podem se enganar. Muitas
vezes, a pessoa retrata um caso como ela interpretou ou recordou, ou acha que
recordou. A pressa também é inimiga neste processo, pois acaba acontecendo
uma pressão sobre a testemunha”.
Assim,
devido a essa estrutura deficiente de nossa polícia investigativa e à
deficiência do próprio sistema, com freqüência ocorre o erro judiciário no
Brasil. E ainda temos a questão racial que influi muito nas decisões do
Judiciário.
Diogo
Tebet, membro da comissão de direito penal do IAB (Instituto dos Advogados do
Brasil), concorda com a tese. “Está comprovado que o sistema penal e
penitenciário é altamente seletivo, discriminatório e estigmatizante”.
A historia de nosso
país está coroada por vergonhosos e escabrosos casos de erros judiciais.
Vejamos alguns exemplos:
O caso dos Irmãos Naves foi um
acontecimento policial e jurídico ocorrido na época do Estado Novo no
Brasill, no
qual dois irmãos foram presos e barbaramente torturados até confessar sua
suposta culpa em um crime que não cometeram. Esse caso é conhecido como um dos maiores erros
judiciais da história do Brasil e um dos que tiveram maior repercussão,
tanto que sua história serviu de inspiração para o filme O Caso dos Irmãos Naves, de Luís Sérgio Person. O caso também foi mostrado em 2003
no programa 'Linha Direta Justiça' da Tv Globo. (fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Irm%C3%A3os_Naves)
Marcos Mariano da
Silva, mecânico pernambucano, foi preso, em 1976, porque
confundido com o homicida que tinha o mesmo nome, Marcos Mariano Silva. Em
1992, durante uma rebelião, policiais invadiram o presídio e Marcos foi
atingido por estilhaços de granada, causando-lhe a perda da visão; passou 19
anos na cadeia, perdeu a saúde, o emprego, a mulher, os filhos e morreu de
infarto, já em liberdade. Seis anos depois, o verdadeiro criminoso apareceu e
foi preso, mas não serviu para reparar o erro cometido contra Marcos. O Estado
de Pernambuco foi reconhecido como responsável pelos danos sofridos pelo
mecânico e terminou sendo condenado a pagar indenização de R$ 2 milhões.
Fabiano Ferreira
Russi foi preso, depois que duas mulheres,
assaltadas em Taboão da Serra, São Paulo, reconheceram como um dos criminosos
em um álbum fotográfico da polícia. O preso estava sozinho no reconhecimento e
não tinha antecedentes criminais, mas, para sua infelicidade, foi fotografado
depois que o delegado determinou identificação de todos os torcedores em batida
policial. Fabiano trabalhava em hotel quatro estrelas da região da Vila
Madalena, São Paulo, e até trinta minutos depois do assalto continuava no
trabalho. Condenado em 2005, permaneceu preso por quatro anos. Após ser
inocentado, perder emprego e arruinar sua vida, busca, agora, indenização pelos
danos que a decisão judicial lhe causou.
Wagno Lúcio da Silva foi preso
no dia em que comemorava 33 anos, 24/10/1997, acusado de latrocínio em
Congonhas/MG, contra o taxista, Rodolfo Cardoso Lobo, assassinado a facadas.
Foi condenado a 24 anos de reclusão e ficou mais de oito anos na cadeia. Em
2006, ingressou com ação de revisão criminal que foi julgada procedente e Wagno
foi absolvido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais; depois disso buscou
ressarcimento pelos danos físicos e morais sofridos; uma das Câmaras Cíveis do
Tribunal de Justiça condenou o Estado a indenizar o ex-segurança no valor de R$
300 mil, mais dois salários mínimos de danos materiais, correspondente a cada
mês em que esteve preso.
Robério Ribeiro da Cruz foi condenado sem provas a 20 anos de
prisão, ficou preso por seis anos, seis meses e quatro dias pelo assassinato de
uma criança, filho de uma ex-namorada, apontado como autor do fato pelo irmão
da mãe da criança, foi solto após o verdadeiro assassino confessar o crime. A
criança fora vítima do assassino em série, Francisco das Chagas Assis de Brito,
que matou 42 crianças, no Maranhão. Embora
inocentado, Robério não conseguiu mais reconstruir sua vida no Maranhão e,
portanto, tenta fazê-lo, desde 2010, em Franca, São Paulo. Não recebeu qualquer
assistência após ser libertado e, embora comprovada sua inocência, a sociedade
continuou a penalizá-lo injustamente: “todos me olhavam de forma estranha (…);
passavam em frente da casa da minha mãe e diziam: ‘É aí onde o matador de
criança mora’. Foi horrível. É ruim demais. Minha mãe sofreu, meu pai. Eles
tiveram que dar o que não tinham enquanto eu estava preso. Destruíram minha
vida… fiquei preso em Pedrinhas (presídio da capital São Luís). Vi muita gente
morrer… era o inferno… eu ficava no seguro.”
O advogado Aldenor
Ferreira da Silva foi condenado a 24 anos de prisão pelo sequestro,
extorsão e assassinato de um homem, fato que se deu em 22/7/1980, na área rural
de Sobradinho, DF. Aldenor ficou preso por um ano e sete meses, mas em
setembro/2011, o Tribunal de Justiça reconheceu o erro, porque o homem tido
como morto foi preso em 1995, em São Paulo. Além disso, observou-se que, no
processo não havia atestado de óbito, nem laudo de exame cadavérico.
Valdimir Sobrosa ficou preso por 11 anos e
oito meses sem julgamento. Depois de todo esse período, Valdimir foi inocentado
do crime de homicídio que não cometeu. Requereu ressarcimento pelos danos
causados e alegou que foi transferido vinte e quatro vezes de presídio o que
impedia a visita de sua família. O Estado do Rio de Janeiro foi condenado pelo
Tribunal de Justiça a pagar a indenização por danos morais de R$ 2 milhões. O
Estado recorreu da decisão.
Eugênio
Fiúza,
ficou preso durante 17 anos acusado de estuprar 17 adolescentes em Belo
Horizonte na década de 90. Fiúza é um dos sósias do bancário Pedro Meyer,
suspeito de ser o verdadeiro responsável pelos crimes. Ao que tudo indica, este
é mais um caso de erro judicial registrado no Estado nos últimos anos.
Lucimário
José de Lira foi
solto em 2009, depois de ficar preso por seis anos na prisão da cidade de
Extrema, no sul de Minas. Lucimário, que sofre de problemas mentais, foi
encontrado na rua de um município próximo à Extrema, e estava sem documentos.
Ao informar seu nome, foi imediatamente preso acusado de homicídio. Na verdade,
o responsável pelo crime era Lucimário José da Silva, morto em 2005. O caso só foi esclarecido quando
um policial pediu que Lucimário escrevesse seu nome completo. Ele contou
também onde havia nascido e em qual escola estudou. Após contato com a
delegacia de Bezerros (PE) e a confirmação das informações, o suspeito foi
solto.
Qualquer cidadão pode ser vítima de erro
judiciário, mas a história mostra que a grande maioria dos casos envolve
pessoas carentes, negras e sem escolaridade, que não possuem a mínima condição
para custear as despesas com advogados, necessitando do trabalho dos defensores
públicos, em muito pouco número no Judiciário brasileiro.
Imagine agora, uma pessoa condenada à morte por ser
homônima ou sósia de um criminoso?
Pior ainda: imagine que a pessoa condenada
injustamente é sua filha...